quinta-feira, 16 de julho de 2009

Timor - um caso de ambivalências estratégicas...


O recente anúncio público sobre as tensas relações dos militares portugueses da GNR com o poder, os grupos políticos e a população em Timor-Lorosae, justifica a abordagem da ambivalência relacional do poder político timorense com os seus aliados, nomeadamente com os que estão "no terreno"... a situação geo-estratégia de Timor não pode, de facto, resistir à influência dos contextos relacionais de vizinhança tal como nenhum país pode escapar à influência regional - excepção a esta realidade é o caso de Israel e todos sabemos a que preço... um preço duplo que passa pela violentissima e continuada agressão do povo palestiniano e, por outro lado, pela dependência de um proteccionismo externo de que os EUA têm sido os principais protagonistas em troca de serviços menos transparentes que a História se encarregará de divulgar!... mas, regressando à questão timorense, registe-se a força das circunstâncias e a correlação de forças que, no plano interno podem, neste contexto, explicar (sem que esta explicação justifique a tolerância, o silêncio e o relativizar das ocorrências) a forma de tratamento de que, neste momento, são objecto os soldados portugueses que aí se encontram em "missão de paz". A negociação de apoio político internacional para a independência de Timor-Leste encontrou em Portugal o espaço ideal, sob alegações de uma partilha afectiva de um passado histórico (que branqueou completamente a relação colonial entre os dois países e os dois povos - como se fosse possível "apagar" a História) e, fundamentalmente, pelo apelo ao uso de uma língua comum (que hoje é evidente não ter, de modo algum, expressão potencialmente dominante) e à prática de uma religião comum... A verdade é que o factor determinante do apoio português massivo à causa timorense foi, indiscutivelmente, a Igreja Católica... e, mais uma vez, como repetidamente ao longo da História, este apoio assentou nessa auto-representação da Igreja que persiste em investir na "expansão da fé", sonhando o evangelizar da Ásia, particularmente, da Ásia islâmica de que a Indonésia é exemplo maior... para além do projecto megalómano que reproduz os estereótipos dos fundamentalismos, enquanto projectos culturais hegemónicos, a Igreja arrastou os portugueses nesse "espírito de missão" de que o "cantar" de um "passado glorioso" é responsável, no mais profundo inconsciente da sociedade portuguesa, ao qual o próprio poder político nacional não resistiu num ímpeto de filantrópica boa-vontade que, de um eventual imaginário relativo ao retirar de dividendos do potencial de recursos naturais timorenses, rapidamente desistiu, percebendo que os custos e a própria disponibilidade timorense para esse efeito não estava na agenda dos líderes, nem no campo das possibilidades económico-fianceiras viáveis para ambas as partes. Conseguir a independência foi a única forma de Timor-Leste garantir o reconhecimento da sua autonomia e identidade cultural mas, o isolamento regional nunca esteve nos horizontes políticos dos seus dirigentes... a independência de Timor-Leste grangeou um respeito institucional internacional a este território, decisivo para a contenção invasora da Indonésia... imaginar que a sua estratégia de afirmação nacional implicava ou se confinaria ao deslumbramento pela protecção portuguesa, é um sintomático sinal do que poderemos designar por "ingenuidade política" que, na sequência desta definição, continuou a investir no envio de "missões de paz" para um território que, neste momento, não precisa de continuar a alardear a sua ligação católica e afectiva a Portugal, por ter adquirido já, no plano internacional, um estatuto que lhe pode garantir apoios bem mais "interessantes" como é o caso não só da ONU mas, acima de tudo, dos EUA e da Austrália... A luta de Timor-Leste pela consolidação da sua política nacional é um processo complexo de que, além de tudo o que aqui se enuncia, se não pode alhear o seu próprio passado identitário societário e cultural de que Ruy Belo deixou, na passada década de 50 do século XX, um excelente e belo testemunho sobre os rituais de morte, a arquitectura tradicional ou a organização social tribal...

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