sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

O Estado... Somos Nós!


Quando se fala em modernização da Administração Pública, a tendência é para acentuar o "peso" do sector nos encargos do Estado e a argumentação recai quase sempre na afirmação da necessidade de redução dos seus recursos humanos. Contudo, assim colocado, o problema enferma de uma legitimidade ética que transcende o equacionar comparativo entre "receitas" e "despesas" e radica, isso sim, em 2 corolários errados, tomados por axiomas, que inquinam quer o diagnóstico fidedigno do que se passa no plano institucional, quer o tipo de procedimentos que se presume possam desenvolver, melhorar e rentabilizar o sector. O primeiro desses pressupostos é, essencialmente, ideológico e decorre da representação socio-política de que o sector institucional é uma espécie de extensão orgânica do aparelho governativo; o segundo define-se pela aceitação cívica sem reservas do primeiro. A perspectiva, determinante para o grau de desenvolvimento de um país, enquanto garante do funcionamento desinteressado e equitativo das estruturas organizacionais, prejudica de forma decisiva a eficácia do aparelho estatal e do seu correlativo apoio ao cidadão porque, refém do funcionamento partidário, o Estado fica exposto e limitado às linhas de orientação que podem variar com a gestão governamental. O problema da centralização e controlo dos procedimentos é característico de sistemas tradicionais que se não identificam com a autonomia conceptualizada para as sociedades tecnológicas e é, por isso, naturalmente, mais grave nos países pobres (não sendo de escamotear a possibilidade de ser esta a causa da sua incapacidade de emancipação económico-social e financeira) e nos que, como Portugal, têm economias deficitárias... porque, supostamente, nos países com níveis elevados de desenvolvimento e crescimento, a confiança nos sectores de recursos humanos técnicos e a dinâmica do sector privado permitem que a própria a estrutura institucional funcione, cumprindo o seu objectivo que é servir a sociedade e que o Governo seja, não uma espécie de proprietário mas, um gestor.

8 comentários:

  1. A premissa é válida e real! Todos somos poucos para enfrentar a realidade. E a realidade: temos demasiada gente no Estado em relação à economia produtora do transaccionável. Não que uma seja a cigarra e a outra a formiga!

    Mas para sabermos que o estado somos nós, nada melhor que ter trabalhado nos dois sectores. À vez, de molde a não nos confundirmos como o boneco de Ivone Silva: a Odete patroa e a Odete empregada!

    Neste caso a Odete sonhadora e a Odete produtora!

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  2. O que se lê nos jornais sobre a administração pública e as opiniões dos comentadores são, no mínimo risíveis. Revelam uma ignorância confrangedora. Muiuto boa a sua análise
    Bom fds

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  3. Olá, Ana,

    Esta questão em torno da melhoria da Administração Pública é uma verdadeira aporia. É que para haver uma melhoria (ou até mesmo para haver Administração Pública) tem de se perceber "sociologicamente" o que é uma sociedade (e para isto têm de contribuir várias "ciências sociais"). Aliás, se se afirmar que um dos objectivos da Administração Pública é, inevitavelmente, o interesse público e, por consequência, este visa acompanhar outras características constitucionais, então a redução de recursos humanos para uma formalidade "tipo" res publica, é atribuir ao Governo um predicado/realidade ontológico(a) que funciona como sistema normativo independente. E não é preciso dizer no que isto se transforma…
    Um abraço grande.

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  4. Caro Maioria Silenciosa,
    Compreendo as suas observações mas, de facto, tudo depende do conceito de Estado que defendemos e das funções que lhe reconhecemos... além disso, há uma perspectiva que penso não terá deduzido das minhas palavras: refiro-me à capacidade de gerir competentemente, não só os recursos técnicos e tecnológicos, mas, acima de tudo, os recursos humanos.
    Obrigado :)

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  5. Carlos,
    Obrigado pelas suas palavras e pelo entendimento alargado do problema que muito deixa a pensar e a dizer em Portugal, onde a "voz populi" faz doutrina, sem recurso à ciência e ao pensamento analítico.
    Um abraço e bom fim-de-semana :)

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  6. Olá Jeune Dame!
    Saudades... já leu o Stieg Larsson?... obrigado pelo excelente comentário que aqui partilha... se me permite, recomendo-o aos leitores como preâmbulo ou nota relativamente ao que escrevi :)
    Aquele Abraço :)

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  7. Obrigada pela resposta… Às vezes penso quão árdua deve ser a sua tarefa de escrever (des)comprometida. Ainda não li o Stieg Larsson, mas tenho de ler! (Vai na volta ainda foi o entendimento dos movimentos antidemocráticos que lhe provocaram ataque cardíaco…).

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  8. Sim, sim, Jeune Dame... foram mesmo os entendimentos anti-democráticos e o espanto perante a opacidade que lhe provocaram o ataque cardíaco... compreende-se!... vivemos dias de uma muito obscura transparência... e é por isso que penso que vai gostar de ler... os 3 volumes, claro!... porque a ficção que Larsson construiu dá conta de uma complexidade extraordinária que, de facto, caracteriza o mundo de hoje... mas, não se preocupe! A ficção, tal como ele a construiu (é de lembrar que foi jornalista especializado em economia!!!), avança a um ritmo progressivamente trepidante e, como num bom filme (daqueles que não foram feitos) em 3D, somos impelidos a ler porque o mergulho é imparável... e nossa imersão decorre do sentimento que nos desperta a consciência de estarmos a acompanhar a eficácia de uma escrita paralela... entre o compromisso e o conhecimento, é um bom "escape" nos caminhos árduos da liberdade :)
    Um grande, grande abraço :)

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